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Um NÃO à municipalização da saúde indígena

Etnias de MT se manifestam contra transferência da saúde indígena à estados e municípios.

Por: Giovanny Vera/OPAN

Na manhã desta sexta-feira, 8 de março, mais de 80 indígenas de todo o estado realizaram um ato na praça Ulisses Guimarães, em frente ao Shopping Pantanal de Cuiabá, se manifestando contra a municipalização da saúde indígena, proposta do Governo Federal que pretende transferir a atenção da saúde indígena aos municípios e estados.

De acordo com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, a saúde indígena é improvisada, com gastos excessivos e com muito dinheiro repassado a instituições que recebem para realizar a atenção, entre elas ONGs e instituições religiosas. “Precisamos reestruturar”, afirmou o ministro.

8 de março é o Dia Internacional das Mulheres, e as indígenas estiveram presentes na manifestação. Mais uma luta delas. Foto: Giovanny Vera/OPAN

Porém, os indígenas não aceitam a proposta, afirmando que vai contra a autodeterminação dos povos tradicionais. “Nós, os indígenas de Mato Grosso e de todo o país, não queremos a municipalização da saúde indígena, porque seria mais uma forma de nos pressionar e reduzir nossos direitos constitucionais, e assim tentar acabar com a gente”, afirmou Crisanto Rudzö Tseremey’wá, presidente da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt), instituição que reúne os 43 povos indígenas do estado.

A proposta levantada pelos povos originários é que a saúde indígena, que hoje é gerenciada pelo Governo Federal por intermédio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), seja conduzida por gestores com perfil adequado e sem indicações políticas, e cumpra o objetivo pelo qual foi criada, de formar um quadro permanente e estável de profissionais da saúde para atender as comunidades indígenas de acordo com suas especificidades.

Indígenas não acreditam que municípios ou estados tenham a capacidade para gerir a saúde indígena. Foto: Giovanny Vera

Em 1999 a lei n° 9.836, chamada lei Arouca, criou a Sesai e estabeleceu o respeito as formas tradicionais de prevenção de doenças e a manutenção da saúde, valorizando tanto o conhecimento tradicional indígena como também os novos conhecimentos e técnicas. A lei criou 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs), considerando como premissa fundamental a participação indígena no controle e planejamento da saúde, remarcando a autodeterminação dos povos indígenas.

Dessa forma, a atenção da saúde nas aldeias é realizada com a participação direta dos indígenas, especialmente com a atuação de agentes de saúde da própria etnia, “que falam a mesma língua, que usam o conhecimento tradicional junto com o conhecimento dos médicos”, explicou Valdomiro Bakairi, presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) Cuiabá, que atende 11 etnias do estado, com cerca de 1700 indígenas. A municipalização seria um retrocesso para os povos indígenas, após longos anos de lutas para o “reconhecimento do valor e importância do conhecimento tradicional indígena para a manutenção do bem-estar da população”, afirmou Valdomiro.

O modelo atual da saúde indígena prioriza especificidades indígenas, como as tradicões e língua própria de cada etnia. Foto: Giovanny Vera/OPAN

O principal temor dos povos tradicionais é que se os municípios e estados recebem a responsabilidade de atender a saúde indígena, essas instituições não terão capacidade para geri-la. “Vai hoje num hospital da cidade, veja como está, é tudo um caos”, disse Valdomiro. “É paciente no chão, morrendo, porque não tem leito, não tem medicamento, não tem médico. Isso acabaria com nossa população indígena”. Eles sabem que engrossariam ainda mais a fila do SUS nas portas dos hospitais.

“Nossa saúde não pode ser objeto de troco, moeda de campanha política. Somos parte da população brasileira, somos brasileiros, exigimos nossa saúde indígena com sua especificidade para atender nossas crianças, nossos idosos nas nossas aldeias, na nossa língua, com nossos conhecimentos e tradições”, remarcou o presidente da Fepoimt.

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