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Viver da Terra

Ações promovem a permanência de famílias de agricultores e integração com indígenas na zona rural da região Xingu-Araguaia.  

Por Tatiane Ribeiro

“Igual a [quando a] gente chegou aqui, não dava para ficar”. A frase de Maria José Pereira de Souza, moradora do Projeto de Desenvolvimento Sustentável Bordolândia (PDS – Bordolândia), em Serra Nova Dourada (MT), reflete as condições da maioria das terras dos assentamentos rurais logo após a obtenção via Reforma Agrária. Erosão, desmatamento e capim são alguns dos elementos com os quais agricultores familiares precisam saber lidar para permanecer na terra e dela tirar o sustento.

“Eu sabia que a gente precisava fazer alguma coisa”. Maria José Pereira de Souza é hoje uma das coletoras da Rede de Sementes do Xingu além de participar ativamente das atividades na comunidade. Foto: Daniel Paranayba

Experiências na região Xingu-Araguaia (MT) demonstram que é possível vencer esses desafios por meio de ações conjuntas, quando famílias se empenham na diversificação de seus quintais e promovem diferentes fontes de renda. Esse é resultado do trabalho da Articulação Xingu Araguaia (AXA), uma iniciativa composta por cinco instituições:Operação Amazônia Nativa (Opan), Associação Rede de Sementes do Xingu (ARSX), Instituto Socioambiental (ISA), Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Associação Nossa Senhora da Assunção (Ansa), que atuam com comunidades de agricultores familiares e indígenas.

As ações buscam mobilizar a sociedade para a criação de alternativas sustentáveis relacionadas ao manejo da terra, restauração de áreas degradadas e geração de recursos a partir da floresta em pé. “Com as mudanças climáticas e o avanço do agronegócio, não basta ter a terra: é preciso criar condições para viver nela”, diz uma das frases de abertura do vídeo “A Roça do Futuro” criado para mostrar o trabalho das instituições na região.

Depois de dez anos no território, o esforço em conjunto da AXA fez com que parte das famílias complementasse a renda a partir da própria produção, reduzindo o trabalho fora de casa e a aquisição de produtos alimentícios industrializados. O processo aconteceu por meio da orientação sobre manejo agroecológico, criação de Áreas de Proteção Permanente (APPs), agrofloresta e restauração ecológica, plantio de árvores nos quintais, coleta de sementes, implantação de rodas d’água, venda de frutas, integração com os Xavante da Terra Indígena Marãiwatsédé, entre outras ações.

O pé de angico foi a primeira árvore que seu Pedro Righi plantou no quintal. Dessa árvore que pode atingir até 20 metros de altura vieram as outras sementes. Foto: Daniel Paranayba

“No começo o pensamento era só tirar leite e hoje tem diversidade: tem leite, tem frutas e tem sementes. Uma diversidade grande”, contou Anderson Righi, jovem morador do assentamento. As atividades favoreceram principalmente as mulheres que não tinham opção de trabalho fora de casa, mas que com as atividades passaram a ter sua própria renda. “Mas quem cuida dos quintais aqui são as mulheres. Então ela vai lá e compra, não precisa depender de marido. É dela, ela que coletou, ela que trabalhou, é uma renda dela”, afirmou Eliane Righi.

A família Righi foi um das pioneiras na participação dos projetos da AXA. Desde 2010 participam das reuniões da CPT e atuam nas demais ações. Foto: Daniel Paranayba

Parte das ações foram realizadas no âmbito do projeto  “Mobilizando o Araguaia Xingu a favor da soberania alimentar e contra as mudanças climáticas”, financiado pela instituição Manos Unidas, que tem como objetivo promover e desenvolver a diversidade socioambiental e a soberania alimentar da região. “Trata-se um projeto inovador e cooperativo, que unifica universos diferentes em prol de um objetivo comum, ou seja, da luta de agricultores familiares e povos indígenas, que se preocupam com a diversidade ambiental e a preservação da identidade cultural”, destacou Lola Campos Rebollar, coordenadora do projeto na AXA.