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Marcelo Okimoto/OPAN

Documentário revela processo de construção da mochila florestal xavante

É a primeira vez que o material pedagógico, já utilizado em outras comunidades latino-americanas, é desenvolvido a partir da cosmovisão de um povo indígena.

Intitulado Mochila Florestal Xavante – TI Marãiwatsédé, o curta-metragem está disponível no canal do YouTube da Operação Amazônia Nativa (OPAN). Com direção do documentarista Laércio Miranda, o material audiovisual foi realizado pela OPAN com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) e do Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS).

O curta-metragem apresenta todo o processo de construção dessa ferramenta pedagógica já utilizada em comunidades no Peru, Equador, Colômbia e Paraguai e que, pela primeira vez, foi elaborada a partir da cosmovisão de uma comunidade indígena. Uma mochila, um tecido de pano, dezenas de figuras relacionadas ao fogo a partir da cosmogonia Xavante e uma cartilha pedagógica adaptada à cultura local. Estes elementos compõem a Mochila Florestal Xavante. 

A ideia é que as comunidades se apropriem desse material para que sejam firmados, a partir das reflexões suscitadas pela atividade, novos protocolos em diálogo com a tradição Xavante. “A ideia é provocar um diálogo comunitário para novos acordos e práticas, o que não significa anular ou substituir práticas tradicionais, mas refletir sobre como a tradição e a cultura poderiam se adaptar para dar conta dos novos desafios”, explica Lola Rebollar, indigenista da OPAN e coordenadora do projeto.

O objetivo é reduzir a incidência de incêndios florestais a partir da sensibilização e da aplicação de práticas sustentáveis de manejo integrado do fogo, mas sem perder de vista o seu uso tradicional, uma vez que o fogo é um dos elementos centrais da cultura Xavante. “O uso tradicional do fogo, a prevenção e o combate a incêndios florestais são conhecimentos importantes. Porque é bom o uso do fogo para a cultura, mas também é bom saber como controlar”, comenta a cacica e professora Carolina Rewaptu, uma das lideranças que acompanhou todo o processo, desde a pactuação até a implementação do projeto piloto. 

O material pedagógico leva em consideração a relação ancestral dos Xavante com o fogo. Além de ser protagonista do mito de criação, o fogo está presente em diversos usos cotidianos e ritualísticos. “É importante que o jovem aprenda esse conhecimento da ancestralidade, que o fogo é importante”, acrescenta Carolina.

A cacica e professora Carolina Rewaptu com a Mochila – Foto: Laércio Miranda/OPAN

Por se tratar de um projeto piloto no Brasil, a mochila está sendo testada apenas em três das 14 aldeias da TI. Posteriormente, as demais mochilas serão distribuídas para a implementação em todo o território. A partir da experiência em outras comunidades latino-americanas, a expectativa é positiva. 

“Temos atuado em diversas partes do mundo para prevenir e reduzir os efeitos dos incêndios florestais e empoderar comunidades tradicionais para tornar decisões mais eficientes e efetivas. Essa ferramenta reúne o conhecimento Xavante para apoiar sua disseminação no processo de prevenção e manejo do fogo”

Pedro Constantino, do  Serviço Florestal dos Estados Unidos (USFS).

Contexto histórico da TI Marãiwatsédé

TI Marãiwatsédé durante o período de seca – Lola Rebollar/OPAN

O povo Xavante de Marãiwatsédé lida frequentemente com incêndios, afinal cerca de 70% da vegetação nativa, em uma área de transição entre a Amazônia e o Cerrado, foi substituída por pastagens. Esse processo ocorreu no período de mais de 40 anos em que o povo foi mantido longe de seu território tradicional em favor de interesses de latifundiários. Retirados pelo Governo Federal em 1966, os Xavante só conseguiram retornar em 2004, sendo que a desintrusão de posseiros e fazendeiros do território só ocorreu em 2013.

Mochila de Prevenção de Incêndios Florestais

Desenvolvido em 2020, o Programa Fogo Regional para a América do Sul surgiu como resposta ao aumento dos incêndios no continente. A iniciativa do USFS, com apoio da Usaid, reúne parceiros e aliados na região. O programa trabalha com várias entidades oficiais e privadas, universidades e comunidades indígenas, os apoiando com recursos técnicos e humanos, especialmente no território amazônico.

Lideranças Xavante e parceiros reunidos para a etapa de validação do material – Túlio Paniago/OPAN

Nesse contexto, a mochila se apresenta como uma ferramenta inovadora para sensibilizar e fundamentar comunidades no que diz respeito às temáticas educativas de manejo integrado do fogo, tornando-se um instrumento estratégico para a prevenção de incêndios florestais, que estão aumentando em tamanho, frequência e intensidade nos últimos anos.

A experiência brasileira é fruto de uma parceria entre o povo Xavante de Marãiwatsédé, a OPAN, com apoio do USFS e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid).