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Só com fé para seguir em frente

Rede Juruena Vivo encerra participação na COP28 em evento que discutiu transparência, transição energética justa e espiritualidade.

Dubai, Emirados Árabes Unidos – Em meio à informação da presença massiva de lobistas da indústria petrolífera na Conferência do Clima e da sensação de que, como Dubai, a COP28 se sustenta na artificialidade de palavras e declarações, a primeira semana da conferência chegou ao fim, assim como a participação da Rede Juruena Vivo. Em seu último evento, intitulado “Aumentando a confiança e a transparência para uma transição energética justa no âmbito do Acordo de Paris”, no Pavilhão da Fé, Marta Tipuici, do povo Manoki, esteve ao lado de Edel Moraes, secretária nacional de povos e comunidades tradicionais e desenvolvimento rural sustentável do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA). As brasileiras ajudaram na compreensão do que deve ser transparência nas discussões sobre clima no nível local. “Transição justa é quando os povos e comunidades tradicionais entendem os documentos, estando aptos a discutir e debater. Transparência é falarmos de justiça social. É garantir participação efetiva nas negociações”, disse Edel.

Promovido pela Cooperação Internacional pelo Desenvolvimento e Solidariedade (CIDSE), Misereor e Fastenaktion, o painel começou com a fala de Tipuici, demonstrando entraves de diversas ordens no nível territorial quando o assunto é energia.

Tipuici Manoki, no Pavilhão da Fé, fala sobre os impactos na bacia do Juruena – Foto: Andreia Fanzeres

O alerta de Tipuici chama atenção para a violação de direitos nos territórios no momento em que a sociedade pressiona pela queda radical dos combustíveis fósseis, se quiser ter alguma chance de cumprir o Acordo de Paris e estabilizar a temperatura do planeta em 1.5º C acima dos níveis pré-industriais.

Os problemas na garantia de condições justas e sustentáveis em suas ações no campo da mitigação, como exemplificadas por Tipuici, fornecem elementos concretos para as análises apresentadas na sequência por David Knecht, de Fastenaktion. Ele divulgou um estudo que experimentou monitorar e avaliar em que medida os países estão progredindo na implementação de suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), ou seja, seus compromissos dentro do Acordo de Paris, e se ainda estão ou não garantindo políticas de mitigação socialmente justas e sustentáveis. O estudo abarcou seis países, entre eles o Brasil. E verificou que, de modo geral, eram inconsistentes e incompletas. Segundo o relatório, feito com dados de 2021, até o início de 2023 (portanto, sem considerar as novas metas do Brasil atualizadas em setembro para Balanço Global) a NDC brasileira não tinha sido apresentada em detalhes e continuava com poucas informações sobre monitoramento e avaliação. Em vez de analisar ações locais, ela focava em iniciativas governamentais para enfrentar as mudanças climáticas.

Tipuici Manoki apresentou mapa de pressões e ameaças na bacia do Juruena – Foto: Andreia Fanzeres

Espiritualidade e clima

Discutir transição energética justa no Pavilhão da Fé suscitou certa curiosidade. Ela se explica pelo fato de que organizações baseadas na fé (Faith-based organizations) e líderes religiosos têm sido presença crescente na Convenção do Clima, demonstrando que a espiritualidade tem seu papel na luta contra as mudanças climáticas. Por isso, pela primeira vez, a Conferência das Partes teve um Pavilhão da Fé na zona azul, onde se realizam os eventos oficiais. Dedicado a garantir espaço para diferentes fés, tradições e perspectivas para alcançar um futuro melhor, este foi o palco para uma reflexão proposta por Tipuici após uma pergunta da plateia sobre como a espiritualidade está implicada nas lutas nos territórios.