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A feira do pirarucu

Povo Deni do rio Xeruã vende pirarucus em Itamarati, provocando o interesse pelo peixe e seu manejo.

Por: Dafne Spolti/OPAN

Itamarati (AM) – Quando os pirarucus da pesca manejada do povo Deni do rio Xeruã chegaram à Itamarati, depois de um dia de viagem pelo rio Juruá, chamaram a atenção de todos por onde passavam. A maior parte do peixe foi vendida logo pela manhã. Além de ser um pescado de qualidade, os peixes tinham a documentação comprovando sua legalidade, já que se tratava de uma pesca devidamente autorizada pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Dessa vez, os Deni levaram quatro peixes, já que os 46 pirarucus restantes foram comercializados para a Associação dos Produtores Rurais de Carauari (Asproc).

Foto: Dafne Spolti/OPAN.

“É lindo demais. A união das cores é muito bonita. O cinza, o vermelho…”, disse a estudante da faculdade de Tecnologia em Produção Pesqueira da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Sabrina Silva Pereira. Quando soube que os peixes estavam na feira, ela foi com a turma conferir. Sabrina ainda não tinha visto um pirarucu inteiro, o maior peixe de escamas de água doce, a não ser em fotos e vídeos. E ficou impressionada. “O mais legal é que tem toda uma preparação para a retirada das escamas”, falou, enquanto assistia o beneficiamento do peixe.

Sebastião Paumari e Darawi Kanamari tirando a escama do peixe. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

“É lindo, né? E é uma satisfação pra gente ver que a reserva [a Terra Indígena Deni] é muito importante no nosso município e que a coisa está andando”, disse o comerciante Marcos Antônio Gomes Lima. Ele espera que as pessoas da cidade tenham consciência da conservação que é proporcionada com o manejo. O responsável da feira, Antônio Wilson Torres Maia, também adquiriu o pirarucu pensando em contribuir com a atividade. “Se não se mantém o manejo, a espécie acaba”, disse.

Venda de pirarucu para Antônio Wilson Maia. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

Foi por um outro motivo que o comprador Luciano Alves Brasil também se interessou pelo peixe. “É porque é legal”, respondeu, de forma direta, mostrando certo incômodo com os produtos não manejados. Ele levou um pirarucu inteiro: metade para preparar em seu restaurante; e a outra metade para enviar para sua mãe em Manaus, com a guia de comercialização e o recibo de venda.

O presidente da Associação do Povo Deni do rio Xeruã (Aspodex), Marizanu Makhuvi Deni, da aldeia Morada Nova, contou que antes de concretizarem a pesca, os indígenas se perguntavam se iriam conseguir levar adiante o manejo, cujas etapas  vêm realizando desde 2009. “Agora nós pegamos a oportunidade do manejo e vamos segurar”, disse. “Daqui pra frente vamos melhorando todas as nossas comunidades, nossa associação e nossos direitos”, afirmou.

A feira de pirarucus realizada pelos Deni vinha sendo anunciada pela Rádio FM do Povo, que recebeu os indígenas em dois programas matinais, um deles com dois Paumari do rio Tapauá, que contaram sua experiência e como o manejo mudou sua vida, trazendo segurança alimentar e união, e com um pesquisador que também apoiou a pesca dos Deni. Pha’avi Hava Deni, da aldeia Boiador, vice-presidente da Aspodex, agradeceu na rádio a todos que foram à feira. Ele contou a história do manejo e apresentou ao público o conceito desse trabalho: “O manejo é preservar o lago, aumentar o peixe para não acabar”. Pha’avi explicou também que com o dinheiro ganho irão investir em projetos para benefício de todo o povo.

Programa do Gerson na Rádio FM do Povo. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

O pesquisador João Vítor Campos-Silva, o JB, que trabalha com manejos comunitários, destacou que muito além de beneficiar o povo Deni, o manejo é bom para todo o município de Itamarati, já que o peixe protegido em sua terra indígena abastece todo o sistema de lagos da região. Ele falou ainda sobre o potencial da cidade trabalhar com o manejo gerando renda e contribuindo ainda mais para a conservação. “Itamarati tem um potencial muito grande de ampliar esse manejo. A gente tem muitos lagos na região de Itamarati, desde a terra indígena até as comunidades rio abaixo. Já tem gente guardando seus lagos, preservando, e isso acaba aumentando a quantidade de peixes”.

O fundamental apoio dos ribeirinhos de Carauari

O manejo dos Deni tem apoio da OPAN por meio do projeto Arapaima: redes produtivas, executado com recursos do Fundo Amazônia. E, por meio dele, conquistou a parceria dos moradores da comunidade Xibauazinho, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Uacari, que estão sempre dispostos a ajudar. Esta é a vila mais próxima à Terra Indígena Deni, localizada no limite entre Carauari e Itamarati.

Moradores do Xibauazinho em sua pesca deste ano. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

Os Deni contam ainda com as organizações de moradores, como a Associação dos Produtores Rurais de Carauari (Asproc), que está adquirindo o pescado e articulando seu escoamento com o das comunidades. Juntos, irão somar 60 toneladas, sendo dez para Carauari e 50 para a merenda escolar, em Manaus.

Para o presidente da Asproc, Manoel Cosme Siqueira, a interação entre os Deni e os comunitários é importante porque, vivendo realidades parecidas, podem superar juntos os desafios e manter o trabalho com o manejo. Ele destacou os ganhos que isso traz para a manutenção da floresta. “Não adianta só uma comunidade conservar. Com esse trabalho conjunto, fica fortalecida a proteção ao ambiente na região”, concluiu.

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