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A parte mais viva de Mato Grosso

Xavante, Myky e Manoki de Mato Grosso mostram como protegem a natureza e a biodiversidade no Belém + 30.

Por: Dafne Spolti/OPAN

Belém, PA – Depois de pegarem avião mesmo com medo, Ana Maria Renemo e Carolina Rewaptu, do povo Xavante de Marãiwatsédé, região de interflúvio dos rios Xingu e Araguaia, em Mato Grosso, estavam no Congresso Internacional de Etnobiologia e Etnoecologia – Belém + 30, contando sobre a recuperação da terra a partir das sementes que coletam e plantam. Da sub-bacia do rio Juruena, as jovens Kojayru e Kantinuwy Myky, do povo Myky e Edivaldo Mampuche, do povo Manoki, apresentaram suas formas de gestão territorial e como estão se fortalecendo politicamente. A atividade, realizada dia 09 de agosto, foi apoiada pelo projeto “Irehi: cuidando de territórios”, realizado pela OPAN com recursos do Fundo Amazônia.

Ana Maria Renemo começou explicando que o nome Marãiwatsédé quer dizer mata perigosa, mas que na retomada de seu território, de onde foram tirados na época da Ditadura Militar, viram que estava muito desmatada. Quando retornaram definitivamente em 2013 tiveram que descobrir novamente como era a terra, conhecer as árvores que sobraram. Desde então realizam expedições, plantando e coletando sementes e reconhecendo melhor Marãiwatsédé. “A gente fica fora da aldeia muitos dias para conhecer a geografia do nosso povo e a espacial”, disse ela.

Nas expedições elas ensinam às jovens seus conhecimentos: “As mais novas têm que conhecer a posição do céu, que é onde se vê o horário de se reunir no acampamento e de não se perder”, explicou Ana Maria. Carolina Rewaptu destacou que as expedições são importantes para conhecer as plantas medicinais, os rastros dos animais e as árvores das florestas. “A resistência do nosso povo está na organização social que é forte, e na cultura”, destacou Carolina.

Chegada da noite em Marãiwatsédé. Foto: Adriano Gambarini/OPAN.

Além de a cada dia devolver fartura a Marãiwatsédé as sementes são comercializadas junto à Rede de Sementes do Xingu, contribuindo para a geração de renda das mulheres e do povo Xavante. A indigenista Elizabete Carolina Zaratim apresentou dados sobre o trabalho, que em pouco tempo teve grande evolução, sendo coletadas apenas duas espécies de sementes em 2011, quando começou o trabalho com a rede, e 34 em 2017.

Expedição de coleta de sementes em Marãiwatsédé. Foto: Adriano Gambarini/OPAN.

Também com expedições os jovens Manoki estão conhecendo sua terra, a partir da vigilância territorial, atividade prevista em seu plano de gestão e pautada pelos mais velhos. “Elas são mais coletivas possíveis”, contou Edivaldo Lourival Mampuche. Ele disse que os jovens antes não sabiam se virar bem na mata e agora já começam a aprender, por exemplo, a preparar os alimentos e a acender uma fogueira estando na floresta. “Eu vejo que a gente tem que criar uma relação com a natureza. Não podemos nos distanciar muito da natureza e da experiência dos mais velhos”, observou Edivaldo, mencionando os próprios aprendizados a partir das expedições.

Edivaldo Lourival Mampuche. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

Entre as práticas de gestão territorial dos Manoki está a coleta de pequi, fruto muito valorizada na região centro-oeste. A atividade é feita entre eles sem o intermédio de atravessadores e chega a render R$ 5 mil por família ao ano. Com a coleta e a abertura de caminhos para o escoamento os Manoki ocupam a terra, que querem ver protegida para a disponibilidade do pequi e de outras plantas. “A coleta do pequi possibilita a conservação porque os indígenas fazem o manejo do cerrado evitando desmatamento e queimadas”, explicou a coordenadora do Programa Mato Grosso, Artema Lima.

Pequi coletado pelos Manoki. Foto: Arquivo/OPAN.

Os Manoki, Myky e também os Nambikwara da Terra Indígena Pirineus de Souza, que não puderam mandar representante no evento, vêm se dedicando ainda às experiências de participação política, o que teve apoio da OPAN a partir de oficinas de formação de jovens realizadas conjuntamente. Como explicaram Kojayru e Kantynowy Myky, isso contribui para que participem de atividades como o congresso Belém + 30 e o Encontro Nacional de Agroecologia em que estiveram este ano, explicando sobre os alimentos plantados na TI Menkü.

Kantynowy explicou que sempre que participam de uma atividade voltam na aldeia e repassam todas as informações. Além disso, se fortalecer politicamente atende a uma preocupação específica dos Myky: “A questão maior que nos preocupa é com nossa terra porque em volta o fazendeiro está desmatando”, disse ela, comentando sobre as áreas de tucunzais, de onde tiram matéria prima para seus artesanatos e para tecer fios.

Da esquerda para a direita: Ana Maria Renemo, Kantynowy Myky e Kojayru Myky. Foto: Dafne Spolti/OPAN.

Enquanto a região do entorno dessas terras indígenas é tomada por atividades como o plantio de lavouras no modelo do agronegócio, as terras indígenas Myky, que tem 98,2% conservada*, Pirineus de Souza, com 93,4%, Manoki e até Marãiwatsédé, que a cada dia fica mais bonita, junto às outras terras indígenas do estado, garantem os espaços de natureza da região. As terras indígenas ocupam apenas 14% de Mato Grosso, mas contribuem para um quarto da área que é conservada no estado.

Expedição na TI Pirineis de Souza. Foto: Rodrigo Ferreira Barros/OPAN.

* Dados do Prodes/Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais(INPE).

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