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Desmatamento mais próximo do Purus Indígena

Uma operação do Ibama realizada em setembro traduz essa paisagem em números: 30 serrarias ilegais 150 caminhões toreiros, 80 tratores, dragas e boi pirata.

Por: Comunicação OPAN

Lábrea, AM – Um sobrevoo pelo sul do Amazonas revela imensos polígonos de desmatamento recém abertos, garimpos em atividade, estradas adentrando a mata fechada, floresta seca atingida por agentes químicos, gado espalhado entre troncos queimados e fumaça. Do chão, uma operação do Ibama realizada em setembro traduz essa paisagem em números: 30 serrarias ilegais 150 caminhões toreiros, 80 tratores, dragas e boi pirata. É a frente de desmatamento que ameaça os sonhos de “amazonizar o Purus”, de Zé Bajaga, coordenador executivo da Federação das Organizações Indígenas do Médio Purus (Focimp).

O alerta foi feito pelo Ibama, representantes extrativistas e outras organizações da sociedade civil durante o Encontro Purus Indígena, que reuniu 150 lideranças da região para a discussão do Plano de Vida da Focimp e do Plano de Gestão das Terras Indígenas Paumari do rio Tapauá, resultados do Projeto Aldeias (OPAN-Visão Mundial). Graças ao projeto, a federação nasceu em 2010, instalou coordenações regionais em Pauini, Lábrea, Canutama e Tapauá, numa área que abrange cerca de 40 terras indígenas e 2.100 quilômetros de rio Purus. “Fizemos trabalhos em quatro municípios, oficinas de cartografia social, mapa das terras indígenas do jeito que os indígenas querem, e temos material para mostrar aos governos”, ressaltou Zé Bajaga.

Com o povo Paumari das terras indígenas Cuniuá, Lago Paricá e Lago Manissuã, o consórcio viabilizou oficinas e estudos para o plano de gestão territorial, abrindo portas para o estabelecimento de acordos internos e demandas claras de parceria, além de capacitação para que os Paumari entrem no mercado legal e manejado de pirarucu.

Dilema do pirarucu

“No segundo ano de projeto paramos de matar pirarucu em alguns lagos e um ano depois vimos como a população se recuperou. Hoje temos 10 lagos de reserva, sabemos fazer a contagem do pirarucu, temos tudo para tirar todo o nosso peixe de forma legal e sem impacto”, contou Germano Cassiano da Silva, que após o intercâmbio oportunizado pelo projeto para a região da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (único local onde o manejo de pirarucu é licenciado na Amazônia), viu a maior parte de seu povo reconhecer que a iniciativa era um ótimo negócio.

Só que todo o esforço de capacitação e conscientização para o manejo sustentável do pirarucu nas terras Paumari corre o risco de não ser levado adiante se a Funai não se articular com órgãos ambientais licenciadores. “Os Paumari sabem manejar sem prejudicar os estoques. Agora precisamos de solução de curto prazo para comercialização até que haja um marco legal do governo, senão eles serão obrigados a vender o peixe a preço baixo para pesqueiros sem licenciamento”, alertou Miguel Aparicio, da OPAN, gestor do Projeto Aldeias.

“Parabéns aos parentes do rio Tapauá pelo plano de gestão. Vocês estão com tudo na mão, agora não podem esmorecer”, apoiou Zé Bajaga. Mas, por enquanto, a Funai não acenou com a possibilidade de solução de curto prazo para a produção Paumari. A Secretaria de Estado para os Povos Indígenas do Amazonas (Seind), por sua vez, prometeu ajudar com articulações. “O governo vai nos dizer em cima do Plano de Vida como ele pode nos ajudar, pois nós conseguimos com muita luta a demarcação das nossas áreas. Mas como estamos? Como vivemos nelas? Estamos cada vez mais imprensados nesses pedaços de terra”, completa Zé Bajaga.

Além de durante o encontro os indígenas demonstrarem preocupação com o atraso no atendimento às inúmeras demandas por parte da Funai, eles destacaram uma série de conflitos de convivência com extrativistas e discordâncias em relação a alguns procedimentos de fiscalização das reservas extrativistas administradas pelo ICMBio.

Representantes do ICMBio e do Ibama, presentes ao evento, reconheceram as limitações, cada vez maiores, de garantir a integridade das áreas protegidas quando o movimento do governo é de centralização dos órgãos ambientais federais. Mas orientaram que eventuais abusos precisam ser denunciados formalmente.

Prometeram ainda aumentar o diálogo com a Funai para tentar agilizar as demandas da região quanto aos problemas localizados entre  indígenas e extrativistas. “Sabemos que a nossa região está bem protegida por causa das terras indígenas e das unidades de conservação, mas nós extrativistas também temos os mesmos problemas graves de saúde, educação e de convivência. Só que a nossa briga maior é com os grileiros, os latifundiários, e contra eles temos que nos unir”, pediu Francisco Monteiro Duarte, o Chicão, vice-presidente da associação dos moradores da Reserva Extrativista do Rio Ituxi.

Reuniões paralelas durante todo o evento garantiram novos compromissos entre o poder público e o movimento indígena para tentar resolver demandas pontuais. No final do encontro, a Focimp sistematizou 18 encaminhamentos resultantes dos três dias de intensas conversas em Lábrea, sinalizando que, com planejamento e união, as demandas poderão ser atendidas.

1) FOCIMP e FUNAI deverão reforçar cobrança de resposta ao INCRA sobre cadastro de indígenas que vivem dentro dos limites das unidades de conservação federais como beneficiários.

2) Marcar reunião entre FOCIMP, ICMBio, IBAMA e FUNAI para definir agenda em conjunto visando solução de conflitos entre ribeirinhos, indígenas e ações do governo federal.

3) Solicitar que ICMBio convide lideranças indígenas para participar das reuniões, a fim de que não haja conflitos de interesses.

4) Abrir canal de denúncia entre FUNAI e IBAMA, a fim de que as demandas de fiscalização dos índios sejam conhecidas pelo IBAMA de forma mais ágil.

5) FOCIMP e FUNAI deverão fazer projetos simplificados sobre a necessidade de uso de madeira, caça e pesca e protocolar documento no IBAMA para que, em caso de apreensão em operações de fiscalização, os produtos possam ser doados para os indígenas.

6) Secretaria Municipal de Saúde de Lábrea se compromete a criar um grupo de trabalho para fazer levantamento da situação atual de saúde nas aldeias em parceria com a FOCIMP.

7) Marcar agenda de reuniões entre FOCIMP, FUNAI e prefeituras municipais do Purus para definição de ações e parcerias.

8) ICMBio se compromete a convidar formalmente a FOCIMP e a OPAN para compor o conselho deliberativo das reservas extrativistas federais no município de Lábrea.

9) FUNAI se compromete a fazer diagnóstico de todas as terras indígenas a partir de 2012 quanto às demandas de vigilância territorial.

10) SEIND se dispõe a dar apoio para capacitação de indígenas e pede que FOCIMP envie um documento definindo os cursos de interesse e quem poderá realizá-los.

11) SEIND se compromete a articular com SDS, IPAAM e as prefeituras municipais do Purus para estruturar a capacidade de fiscalização ambiental nas proximidades das terras indígenas.

12) SEIND se compromete a apoiar a regularização do manejo de pirarucu nas terras indígenas Paumari do rio Tapauá no âmbito do comitê gestor, visto que a OPAN já encaminhou os estudos realizados no âmbito do Projeto Aldeias. E que a FOCIMP acompanhe este processo.

13) OPAN, FOCIMP e SEIND se comprometem a formar um grupo de trabalho para elaborar um projeto de pesca na região.

14) Formado o grupo de trabalho dentro da FOCIMP para articular a elaboração dos cinco projetos da entidade.

15) FUNAI se compromete a destacar um técnico para participar da elaboração dos cinco projetos da FOCIMP.

16) Grupo de trabalho da FOCIMP deverá rastrear recursos para projetos indígenas nos diversos ministérios.

17) A FOCIMP deverá cobrar a construção de um centro de comercialização de produtos indígenas em Lábrea, que está previsto no Plano de Governo/PPA/SEIND.

18) Proposta ao Comitê Gestor – CR Purus a se comprometer a convidar os representantes dos extrativistas para suas reuniões.

Projeto Aldeias

O Projeto Aldeias se desenvolveu em 7 terras indígenas nas bacias dos rios Purus, Juruá e Jutaí. É uma iniciativa da OPAN e de Visão Mundial com apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) para apoiar a conservação da biodiversidade e ao manejo de recursos naturais nas terras indígenas Katukina do Biá, Deni, Paumari do Rio Cuniuá, Paumari do Lago Paricá e Paumari do Lago Manissuã, além do fortalecimento das organizações indígenas locais e regionais. Houve também uma componente em parceria com a Coordenação de Índios Isolados e de Recente Contato (FUNAI/CGIIRC), de proteção etnoambiental dos povos indígenas Hi Merimã e Suruaha, no marco da Frente Purus de Proteção Etno-ambiental.

OPAN

A OPAN foi a primeira organização indigenista fundada no Brasil, em 1969. Atualmente suas equipes trabalham em parceria com povos indígenas do Amazonas e do Mato Grosso, desenvolvendo ações voltadas à garantia dos direitos dos povos, gestão territorial e busca de alternativas de geração de renda baseadas na conservação ambiental e na manutenção das culturas indígenas.

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