A PNGATI e a esperança por dias melhores
De diversas regiões da Amazônia, representantes indígenas compartilham na COP27 reflexões e experiências sobre a PNGATI à luz do novo governo no Brasil.
Por Andreia Fanzeres/OPAN
Nesta quarta-feira, aconteceu no Pavilhão Indígena da COP27 o Painel “A Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (PNGATI) e os povos da Amazônia brasileira”. O objetivo foi demonstrar como esta é uma política estratégica no contexto da implementação de ações climáticas na Amazônia, que merece ser mais conhecida e apoiada. O evento reuniu lideranças indígenas de diversos estados amazônicos, que compartilharam experiências e visões sobre esta importante política pública para os povos indígenas do Brasil.
Os planos de gestão territorial e ambiental (PGTAs), um dos instrumentos para implementação da PNGATI, foram foco da análise dos painelistas. “Os planos precisam ser construídos de baixo para cima, pela coletividade e esse é um processo que pode levar anos de conversa”, destacou Ianukula Kaiabi Suiá, presidente da Associação Terra Indígena Xingu (ATIX). Zé Bajaga, da Federação das Organizações Indígenas do Médio Purus (Focimp) apontou que em sua região há 48 terras indígenas, mas só 8 têm planos de gestão. “Nós fazemos o trabalho de proteção territorial e de nossas águas”, ressaltou.
“A formação também é importante e nos leva a espaços de incidência onde podemos compartilhar nossas experiências para a gestão de nossos territórios”, destacou Jessica Maria Wapichana, do Conselho Indígena de Roraima (CIR). Ela falou sobre protagonismo indígena no levantamento de informações e na produção de conhecimento que levam à construção de instrumentos como os planos de enfrentamento às mudanças climáticas e os calendários etnoecológicos. Também do CIR, Jabson Nagelo explicou como se dá o trabalho das brigadas indígenas em Roraima e do uso da tecnologia aliada ao conhecimento tradicional para fazer o monitoramento territorial.
Para Marciely Tupari, coordenadora secretária da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), a formação sobre PNGATI e a implementação dela segue muito importante para os povos indígenas, e seria importante avançar na realização de intercâmbios entre povos que têm e os que ainda não têm planos de gestão sendo implementados nos territórios. “Muitas pessoas ainda não conhecem a PNGATI e não têm planos de gestão. Isso atrapalha a execução de projetos nos territórios. Precisamos aproximar os povos desse instrumento de política territorial tão importante, principalmente as mulheres. Eu era criança durante as consultas para a construção desta política e aprendi sobre ela porque minha mãe estava participando da construção”, relatou. “As mudanças climáticas afetam em especial mulheres e crianças e os planos de vida precisam garantir uma atenção especial a isso”, completou Dadá Baniwa, coordenadora do departamento de mulheres da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn).
Dineva Kayabi, da Rede Juruena Vivo e coordenadora de mulheres da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt), explicou que a Terra Indígena Apiaká-Kayabi, onde vive, ainda não tem plano de gestão e esse instrumento poderia ajudar a enfrentar as muitas ameaças que pressionam sua terra. “Na bacia do rio Juruena há 172 usinas hidrelétricas nos ameaçando, mas 70% delas ainda estão no papel. A Usina de Castanheira, em especial, pode afetar diretamente meu território porque podemos perder nossos peixes, a pescaria do tracajá, importante para a cultura dos Apiaká, além dos nossos remédios da mata, o acesso às sementes e outros.
Esses tantos problemas enfrentados pelos povos indígenas em seus territórios reforçam a relevância da retomada da PNGATI como uma política ainda mais forte no Brasil. De acordo com Sineia Bezerra do Vale, do CIR, que moderou o painel, esta é uma política vigente, que resistiu com firmeza aos últimos quatro anos de um governo que retrocedeu na proteção aos direitos indígenas porque foi construída a partir de um processo de consulta. “Temos uma grande expectativa de que com o novo governo no Brasil os nossos espaços internos de discussão e incidência sejam retomados. Se esta quer ser a COP da Implementação, o que a PNGATI precisa é de apoio e financiamento para ela acontecer no chão”, ressaltou. Alberto Terena, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), fez uma relevante colaboração ao painel ao final, comentando que com a retomada dos espaços como o Câmara Técnica de Mudanças Climáticas do Comitê Gestor da PNGATI, do qual fazia parte, haverá melhores condições de interlocução entre os povos indígenas e o governo. “Até agora estamos pagando a conta sozinhos. Precisamos de apoio. Essa empreitada não é só nossa”, lembrou.
O evento foi organizado pela Rede de Cooperação Amazônica (RCA), Operação Amazônia Nativa (OPAN), além de CIR, Coiab, ATIX, Foirn, Rede Juruena Vivo, Fepoimt, Focimp, com o apoio de Fastenaktion, Fundação Rainforest Noruega, Instituto de Pesquisa e Formação Indígena (Iepé), Instituto de Educação do Brasil (IEB) e Instituto Socioambiental (ISA).