Nós, povos indígenas e comunidades rurais da Bacia do Juruena, movimentos sociais, associações e organizações da sociedade civil, reunidos de 04 a 07 de novembro de 2023, na aldeia Nova Munduruku, Terra Indígena Apiaká-Kayabi, município de Juara-MT, participamos do 10º Festival Juruena Vivo, sob o tema “Conectando territórios e somando lutas para o Bem Viver”.
Refletindo sobre as lutas, o amadurecimento e as vitórias da Rede Juruena Vivo durante essa trajetória de uma década, nos reconhecemos como um coletivo que se posiciona como resistência diante de projetos que afetam nossos territórios, modos de vida tradicionais, cosmovisões e direitos.
A Rede mantém constante monitoramento dos empreendimentos de energia, mineração e obras de infraestrutura na bacia do rio Juruena, gerando alertas sobre seus avanços e impactos nos territórios. Esse monitoramento vem detectando o aumento de requerimentos de lavras garimpeiras e minerárias, inclusive sobrepostas às terras indígenas.
Nos manifestamos contra os projetos de hidrelétricas na Bacia do Juruena, levantados aproximadamente 180 projetos, com destaque para a UHE Castanheira, UHE Juruena e UHE Mato Grosso, apresentados como falsas soluções para a crise climática e transição energética, mas que destroem a vida de nossos rios e colocam em risco a soberania alimentar e reprodução cultural dos povos.
Apontamos, ainda, a insuficiência de estudos em relação às Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGHs), especialmente as PCHs do Rio do Sangue, formando uma cadeia de impactos cumulativos e sinérgicos que são subdimensionados nos licenciamentos.
Em nome da garantia da subsistência e resguardo das culturas que dependem da pesca no estado de Mato Grosso, nos manifestamos pela celeridade da ação de inconstitucionalidade da alteração da lei de pesca nº 9.096/2009.
Cabe ressaltar que diversos empreendimentos na Bacia do Juruena não respeitam os protocolos de consulta dos povos da região, além de não realizar consultas prévias, livres e informadas, como preconiza a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário.
Reivindicamos que o Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (DPU) atuem frente à violação sistemática desse direito, principalmente em relação à captura pelas empresas do dever do Estado de realizar a consulta, o que vem sendo autorizado pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema-MT) e Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso. Exigimos que desde o planejamento de qualquer empreendimento se respeite o direito à consulta e que o posicionamento dos povos da bacia seja respeitado.
A juventude e as mulheres da Bacia do Juruena entendem que a participação nesse espaço é importante para a formação de lideranças futuras, inspiradas pelas atuais lideranças, comunicadores, artistas e cineastas indígenas.
Reivindicamos apoio para a garantia plena da educação em todos os níveis, até a graduação e pós-graduação. Acreditamos que a comunicação feita nas bases é instrumento para a proteção dos territórios e divulgação das culturas que são ricas na bacia do Juruena, sendo um potente instrumento de luta dentro do movimento.
Discutimos, durante o evento, as percepções e adaptações dos povos e comunidades para o enfrentamento às transformações do tempo. Não é papel apenas dos povos indígenas e comunidades tradicionais frear a crise climática, mas sim um papel de todos.
Nós, povos da floresta, somos os que mais sofrem com os impactos das mudanças do clima e os que mais preservam a biodiversidade e as florestas. É papel do Estado pensar em políticas públicas que permitam a autonomia dos povos indígenas e tradicionais no enfrentamento às mudanças climáticas, como, por exemplo, a construção de seus planos de enfrentamento à crise climática e o reflorestamento de áreas degradadas ao longo da bacia do rio Juruena.
Questionamos a lógica de produção baseada na exploração, contaminação e destruição da natureza e modos de vidas tradicionais, na reprodução de uma monocultura social e produtiva. Esse modo ultrapassado de modelo econômico gera conflitos e desigualdades. E não deixaremos que isso degrade nossos territórios.
Queremos apoio na produção de nossas próprias economias, que são baseadas no compartilhamento de recursos, e não no acúmulo, e que respeitem as nossas diversidades de saberes, culturas e modos de produção. Buscamos fomento e políticas públicas que possibilitem o desenvolvimento dessa nossa economia garantidora do abastecimento de nossas famílias e fonte de renda sustentável, para viabilizar que as presentes e futuras gerações permaneçam nos territórios.
A rede Juruena Vivo soma na luta contra os retrocessos em relação aos direitos indígenas, como a tese do Marco Temporal e outros projetos de lei. Exigimos a demarcação das terras indígenas, em especial a Terra Indígena Tapayuna, povo forçado a sair do território tradicional na bacia do Juruena, que tem o direito de retornar e ter garantido seu território originário, ameaçado por projetos extrativos e pela UHE Castanheira.
Nessa caminhada, conseguimos frear o avanço de vários desses projetos de morte por meio da luta, do desenvolvimento do nosso monitoramento territorial com sistemas de alertas e da comunicação popular. Alcançamos espaços para alçar nossas pautas a nível regional, nacional e internacional. Esse trabalho resulta na proteção dos territórios e fortalecimento das comunidades que compõem a Rede Juruena Vivo, tendo suas vozes ecoando mundialmente. Finalizamos a 10ª Edição do Festival Juruena Vivo revigorados e revigoradas para a luta, através do reconhecimento das vitórias ao longo dessa década de caminhada coletiva.