OPAN

Juventude Indígena de Mato Grosso cria associação em sua primeira assembleia

A saúde mental e a geração de renda foram os principais temas abordados por representantes das sete regiões do estado

A força da juventude indígena de Mato Grosso tomou conta do território Umutina, em Barra do Bugres, durante a sua primeira assembleia, realizada entre os dias 12 e 15 de setembro. Com o tema “Unindo Saberes, Fortalecendo a Tradição e o Nosso Futuro”, cerca de 200 jovens de diferentes povos se reuniram para debater questões fundamentais para suas vidas e comunidades.

Assembleia foi organizada por jovens indígenas. Foto: Helena Corezomaé

Educação, saúde, sustentabilidade, direitos territoriais e mudanças climáticas foram alguns dos temas discutidos nas mesas, que tiveram a participação de palestrantes indígenas. Em cada assunto tratado, os jovens compartilharam vivências, projetos e apontaram soluções para construção de um futuro em que os povos originários tenham voz e protagonismo.

“É muito importante esses debates para ouvir realidades diferentes, o que cada povo está passando e o que a gente precisa melhorar. Acredito que essa assembleia vai ficar marcada na história dos povos indígenas de Mato Grosso”, disse Kauwe Zunizakae do povo Haliti-Paresi. 

Para Jadilson Kanuxi, do povo Manoki, esses encontros também são determinantes para a continuidade de uma luta ancestral. “Viemos com seis delegados e foi muito importante colocar nossas demandas. Como jovem, está sendo muito importante para mim seguir a luta que as nossas lideranças deixaram para nós”. 

Os temas foram variados, mas dois desafios cruciais para a juventude indígena estiveram presentes em todas as discussões: a saúde mental e a geração de renda nos territórios, demonstrando a urgência de encontrar soluções para essas questões.

“Vários jovens estão tendo que sair de seus territórios em busca de trabalho na cidade. Muitos se formam, mas não têm emprego no território e isso faz com deixem o território com a família. Essa mobilização pode ajudar a fortalecer a sustentabilidade e a geração de renda dentro dos próprios territórios”, afirmou Genilson Torika Kiri, do povo Balatiponé. 

Evento foi realizado no território Umutina. Foto: Helena Corezomaé

Saúde mental e casos de suicídio 

Wagner Ariabo Kezo, do povo Balatiponé, não segurou as lágrimas ao compartilhar com os participantes a dor da perda de uma amiga no ano passado. Ele ressaltou o quanto isso afetou ele e outros amigos. Em seguida, Andrya Kiga, do povo Boe-Bororo, também falou sobre a morte de uma amiga trans. 

“Chorei muito por ela, mas prometi que não ia mais chorar, agora sigo por ela e no final do dia penso que foi mais um dia vencido”, disse Andrya, que também é uma mulher trans. 

A palestrante Kiga Bóe, doutoranda em antropologia social pela Universidade Federal de Goiás (UFG), também comentou sobre a perda. 

“A Brenda se matou em 2020. Ela foi a primeira que se assumiu como uma mulher trans. A Saúde teve uma grande atuação na época que ela morreu. Tivemos acompanhamento psicológico. Teve o setembro amarelo, mas depois acabou”.

As histórias relatadas durante as discussões evidenciam a importância do cuidado com a saúde mental, da criação de políticas públicas e a necessidade de acompanhamento psicológico contínuo e especializado para os jovens indígenas.

“A gente discute bastante essa problemática que vem atingindo as populações indígenas. Não tem um trabalho profundo sendo realizado. Tem poucos profissionais atuando e tem que ter mais. Aumentaram os problemas nas comunidades. Meu povo teve caso de suicídio”, relatou o professor Gilmar Koloizomae que cobrou ações das instituições.

Organização da juventude 

No sábado e domingo, os esforços foram concentrados para a criação, definição do nome, a forma de atuação e a diretoria da Associação dos Jovens Indígenas de Mato Grosso (AJIMT), que será parceira da Federação dos Povos Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt). 

“A gente finalizou o evento, mas estamos iniciando uma nova história da juventude, para a gente continuar lutando pelos nossos direitos, para defender nossos territórios e biomas”, destacou Alex Onaezokemar, do povo Paresi-Haliti, sobre a criação da AJIMT. 

Assembleia foi realizada de 12 a 15 de setembro. Foto: Helena Corezomaé

Com uma diretoria composta por representantes de diferentes regiões, a associação demonstra sua diversidade e compromisso em representar os interesses dos jovens indígenas do estado. Wagner Ariabo Kezo, Aline Manoki, Nany Zonezokemae, Vinicius Marcos Chiquitano, Rosália Guató e Nelsinho Xavante assumiram as funções de presidente, vice-presidente, tesoureiros e secretários, respectivamente.

Sebastião Arruda, do povo Chiquitano, lembrou que as discussões para realização do evento e a criação da AJIMT começaram no Acampamento Terra Livre (ATL) deste ano. Agora, constituída, avalia que “será um espaço para agregar e fortalecer a luta dos povos originários”.

Atailza Marikjasi, do povo Manoki, resumiu o sentimento de todos os jovens presentes: “O que todos nós esperamos é que o futuro seja melhor do que foi para nossos antepassados e que possamos deixar um legado para as próximas gerações”. A criação da associação é um passo importante nessa direção, demonstrando o compromisso da juventude indígena em reivindicar seus direitos.

Cerca de 200 jovens participaram da assembleia. Foto: Helena Corezomaé