Economias sustentáveis fortaleceram povo Apiaká durante retomada do território
Coleta de castanha e pesca esportiva geram renda na TI Apiaká do Pontal e Isolados
Por Túlio Paniago/OPAN
Após mais de 25 anos de luta, o povo Apiaká teve finalmente o reconhecimento de sua terra pelo Estado brasileiro. Essa conquista e o fim do licenciamento da Usina Hidrelétrica Castanheira, que colocava em risco toda a sociobiodiversidade da bacia do rio Juruena, foram celebrados na 11ª edição do Festival Juruena Vivo, realizado entre os dias 08 e 10 de novembro na aldeia Curva, Terra Indígena (TI) Erikpatsa), do povo Rikbaktsa.
Durante uma das mesas do evento, intitulada “Economias regionais que valorizam a floresta e o Cerrado em pé”, representantes de povos indígenas e comunidades tradicionais trocaram experiências a partir de suas respectivas práticas com diferentes cadeias de valor da sociobiodiversidade. Foi nesta oportunidade que Eduardo Morimã, do povo Apiaká, detalhou como o manejo da castanha do Brasil e o turismo de base comunitária foram importantes para garantir o bem viver da comunidade durante o processo de retomada do território.
Além da geração de renda de forma sustentável, as atividades contribuíram diretamente com a gestão territorial. Afinal, favoreceram que o povo pudesse se manter no território, ajudando também a impedir o avanço de pressões e ameaças que poderiam causar uma série de prejuízos socioambientais.
“Quando a gente reocupou a nossa terra tradicional, tinha um garimpo muito próximo, a uns 15 minutos de barco. E a gente percebeu que se não tivesse uma fonte de renda para dar sustentabilidade econômica para as famílias dentro do território, talvez alguns indígenas acabariam procurando serviço no garimpo”, relembrou Eduardo.
Diante desse contexto, os Apiaká se organizaram para estruturar o manejo da castanha e o turismo de base comunitária a partir da pesca esportiva. “A gente trabalha de março a novembro no turismo. Aí entra o período da castanha, que vai de dezembro até o começo da outra temporada [de pesca]”,explicou Eduardo.
Além de ajustar as agendas naturais das duas atividades, também tiveram que conciliá-las ao próprio calendário local. “A gente também não podia abrir mão da nossa roça, da nossa cultura e costumes, tudo está envolvido. Então, quando chega a época da roça, a gente reveza. Quem já está no turismo há mais tempo, vem pra fazer a roça. E quem estava na aldeia, e que já fez sua roça, vai pra lá trabalhar no lugar de quem veio”, detalhou Eduardo.
Os Apiaká estão finalizando a carta de anuência solicitando autorização da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para a prática de turismo de base comunitária na TI Apiaká do Pontal e Isolados. Mas já trabalham legalmente com o turismo de pesca há três anos, afinal são protagonistas de uma pesquisa com chumbadas biodegradáveis (à base de argila e areia), uma alternativa ecológica às tradicionais de chumbo, que são comprovadamente tóxicas. “Fizemos o experimento da chumbada ecológica e tem dado muito certo. Deu visibilidade ao projeto e possibilitou que a gente conseguisse trabalhar”, relatou Eduardo.
Por fim, sobre os benefícios do turismo e do manejo da castanha, ele destacou o envolvimento da comunidade, a proteção ambiental, a geração de renda para as famílias e o fortalecimento de suas organizações. A implementação do turismo de base comunitária e o fortalecimento da cadeia produtiva da castanha são eixos do Berço das Águas, projeto realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) junto aos povos Apiaká e Rikbaktsa, com patrocínio do Programa Petrobras Socioambiental. O Berço das Águas também apoiou a realização desta e de outras edições do Festival Juruena Vivo.
Economias regionais que valorizam a floresta e Cerrado em pé
Além de Eduardo Morimã, outras pessoas compartilharam suas experiências durante a mesa “Economias regionais que valorizam a floresta e cerrado em pé”. Aproveitando o gancho do turismo, Ana Vylena Souza, da Rede Tucum (CE), falou sobre a experiência bem sucedida do turismo de base comunitária em comunidades extrativistas cearenses.
Tatá Apurinã, vice-presidente da Associação dos Produtores Indígenas da Terra Indígena Caititu (APITC), do Amazonas, deu detalhes sobre o sistema de agrofloresta e sobre o papel da associação nesse trabalho. Jomilson da Silva Andrade, também da TI Caititu, explanou sobre o manejo da castanha-da-Amazônia e como a estruturação da atividade tem contribuído com a qualidade de vida do povo Apurinã.
Aldenor Matsimu, presidente de uma das associações do povo Rikbaktsa, apresentou o histórico da agricultura familiar na TI Japuíra e sua importância para o povo. Ele ressaltou o projeto que estão trabalhando atualmente, que prevê a produção sustentável de diversos alimentos em cem hectares do território, sendo que cada família será responsável por um hectare.
Elaine Guilherme, presidente da Associação São Brás de Nova Bandeirantes, também relatou sua experiência na agricultura familiar. O grupo de mulheres Cereja Negra, do qual faz parte, produz cafés especiais com práticas sustentáveis. Ela detalhou a organização e estruturação da atividade, que hoje é a principal fonte de geração de renda de sua comunidade.
Também compuseram a mesa Eduardo Darvin, do Instituto Centro de Vida (ICV), e Renato Pereira da Silva, do Pacto das Águas, que apresentaram detalhes sobre projetos de geração de renda sustentáveis que suas organizações têm apoiado junto a povos indígenas e comunidades tradicionais.