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Conferência das Mulheres Indígenas começa com a força das ancestralidades

Autoridades e plenária representativas da diversidade se unem contra a violência, para pautar os direitos das mulheres e a defesa da democracia no Brasil

Áudio gerado por IA

Por Dafne Spolti/OPAN

A abertura da I Conferência Nacional das Mulheres Indígenas, realizada nesta segunda-feira (4), em Brasília, foi um momento histórico em que lideranças políticas se somaram a ministras de Estado de diferentes pastas pelo do fim da violência contra as mulheres, em defesa da democracia e por políticas públicas diferenciadas.

Foto: Talita Oliveira | OPAN

Sonia Guajajara, Macaé Evaristo, Marina Silva, Célia Xakriabá, Joenia Wapichana, Márcia Helena Carvalho Lopes e Margareth Menezes se colocaram com as demais autoridades em uma mesa tão plural e representativa quanto a própria plenária da Conferência, que contou com a presença de mulheres indígenas de todo o Brasil e de países do exterior.

“É com imensa alegria e profundo respeito que saúdo cada uma das mulheres indígenas aqui presentes. Dessas mulheres que chegaram aqui vindas das florestas, das serras, dos cerrados, das beiras dos rios, das aldeias e também das cidades. É emocionante olhar para essa plenária e ver reunidas tantas lideranças guardiãs da vida e do planeta, portadoras de conhecimentos milenares e construtoras do futuro”, disse a ministra Sonia Guajajara, do Ministério dos Povos Indígenas (MPI).

Ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. Foto: Talita Oliveira | OPAN

Cantos e resistência

A energia da atividade foi permeada pelos cantos e orações que ocorreram na IV Marcha Nacional das Mulheres Indígenas, em que se realiza a I Conferência Nacional de Mulheres Indígenas, organizada por meio de uma parceria entre o MPI, o Ministério das Mulheres e a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga). Entre as manifestações culturais, uma mais bonita que a outra, tomou o ambiente o canto fininho e grandioso das indígenas Kayapó para o início da Conferência.

“A gente pensar a presença de mulheres nesse espaço e na política por si só é revolucionário, por si só já é transformador, porque nunca nos sonharam nesse espaço. Então é maravilhoso olhar pra Brasília e ver tantas mulheres, de tantos povos, de tantos povos do Brasil ocupando esse lugar, que é um lugar nosso por direito”, afirmou a ministra de Direitos Humanos, Macaé Evaristo.

“Hoje nós fazemos história. E todas somos esta história”, disse a diretora da Anmiga, Joziléia Kaingang, contando o percurso até a realização da Conferência, idealizada em 2019 e consolidada como resultado do esforço político protagonizado pelas mulheres nos últimos anos. “Nós, mulheres indígenas, somos guardiãs dos nossos corpos e dos nossos territórios. Somos defensoras do bem-viver. Somos defensoras da Justiça Climática, dos saberes ancestrais e é com força que abrimos este grande encontro”.

Joziléia Kaingang, diretora da Anmiga. Foto: Talita Oliveira | OPAN

Apoio às lideranças 

A deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG) e a ministra Marina Silva, do Ministério do Meio Ambiente e do Clima, foram ovacionadas pelas mulheres em gesto de apoio diante dos ataques que ambas vêm sofrendo no Congresso Nacional. “Antes daqueles e daquelas que usavam paletó, as mulheres sempre foram e vão continuar sendo as que se fazem autoridade no Brasil”, afirmou a deputada Célia em uma fala importante que pode ser assistida no vídeo da abertura da Conferência no link.

Deputada federal Célia Xakriabá. Foto: Talita Oliveira | OPAN

“Cada uma que está aqui, cada um paga um preço para defender o povo preto, para defender as mulheres, para defender os indígenas”, disse a ministra Marina Silva, reforçando a notoriedade dessa escolha e o protagonismo das próprias comunidades. “Quem faz a maior defesa é quem resiste nos territórios”, afirmou.

Enfrentamento de violências contra mulheres indígenas

A ministra Macaé Evaristo falou sobre as situações mais recorrentes de violência aos povos indígenas que chegam ao Ministério dos Direitos Humanos: os casos de assassinato, de mortalidade nos territórios indígenas em função dos conflitos territoriais e ambientais. “Teremos muito trabalho nesses dias, muita coisa por fazer”.

Joenia Wapichana, presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) lembrou as graves violências cometidas contra as mulheres indígenas, dizendo um basta às violências psicológicas, mentais e físicas, ao mencionar a recém-divulgada situação de estupro coletivo cometido por agentes públicos contra uma mulher do povo Kokama e a luta por Justiça. “Chega de violência aos corpos femininos”, protestou Joenia.

Ela destacou a importância das mulheres indígenas nos diversos espaços de poder: “Estamos incluídas e preparadas para debater todos os assuntos. Quando digo preparadas, é que nós podemos assumir qualquer espaço, seja ele público, seja ele no movimento indígena, seja na representação política como a deputada Célia Xakriabá”.

Joenia Wapichana, presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Foto: Talita Oliveira | OPAN

Democracia e o fortalecimento de políticas públicas

Márcia Helena Carvalho Lopes, ministra do Ministério das Mulheres, iniciou sua fala em defesa da democracia, já que a realização de conferências só é possível em governos democráticos. Relembrou  que até mesmo ministérios como os presentes na abertura da Conferência, de grande importância para a população, ficam em risco em outros regimes, como ocorreu no governo anterior, que extinguiu ministérios e cancelou conferências.

“É preciso lutar muito para que o Brasil tenha condição de ser o país dos seus povos, dos povos originários, dos povos e comunidades tradicionais, os povos que respeitam as mulheres. As mulheres quilombolas, indígenas, as mulheres negras, as mulheres catadoras, as mulheres da rua, as mulheres migrantes, as mulheres com deficiência, as mulheres de todas as matas e florestas e cantos deste país”, afirmou, destacando o aprendizado que tem sido possível ao Ministério para qualificação de seu trabalho a partir das trocas com os diferentes fóruns de mulheres no país.

Abrilhantando a Conferência, a ministra da Cultura, Margareth Menezes, referenciou as mulheres indígenas. “São guardiãs de palavras, de memória, do território, são as que transmitem os saberes, cultivam os alimentos, criam as crianças, sustentam a coletividade e movem o futuro”. Atendendo aos pedidos insistentes da plenária, ela também cantou.

Próximos passos

A realização da I Conferência Nacional de Mulheres é resultado de etapas estaduais e regionais, realizadas em todos os biomas do país. Ela tem por objetivos a avaliação da ação indigenista do Estado brasileiro voltado às mulheres indígenas, a reformulação e reafirmação das políticas e garantias para as mulheres indígenas, as contribuições para um plano nacional de políticas para mulheres indígenas sob a perspectiva de enfrentamento às violências e, por fim, as contribuições para consolidação da Política Nacional das Mulheres. As propostas definidas na etapa nacional vão compor a realização da 5ª Conferência de Políticas Públicas para Mulheres , que será realizada de 29 de setembro a 01 de outubro.

Foto: Talita Oliveira | OPAN