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Cresce número de PCHs e CGHs previstas para a bacia do Juruena

Mapeamento realizado pela OPAN revela aumento de pequenos empreendimentos em cascata e deficiência na transparência pública de informações socioambientais.

Por Beatriz Drague Ramos/OPAN

Em apenas um ano, nove empreendimentos hidrelétricos projetados em cascata foram incluídos no planejamento energético para a bacia do rio Juruena, ameaçando diretamente um dos poucos rios livres da região, o Sauê-Uiná. Junto com Membeca (8), Buriti (15) e Juruena (20), este rio, localizado na região de ocupação imemorial do povo Nambikwara, passou a figurar entre os principais pontos de atenção no monitoramento independente de hidrelétricas realizado pela Rede Juruena Vivo e pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) na bacia do rio Juruena, de acordo com dados oficiais apurados entre março e setembro de 2020.

A projeção de uma sequência de empreendimentos de pequeno porte em um mesmo rio tem sido frequente na bacia do Juruena, comprometendo sua saúde e suas funções ecológicas e sociais, segundo o relatório técnico da entidade. 

De acordo com a avaliação dos autores do estudo, as alterações na legislação favoreceram o avanço desses complexos hidrelétricos. Ao comparar os dados de 2020 e 2019, observa-se uma manutenção do comportamento dos empreendedores de investir em projetos de PCHs e CGHs que tendem a se concentrar num mesmo curso d’água. Devido à Resolução Normativa nº 875, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), de 10 de março de 2020 e à Lei nº 13.360, de 17 de novembro de 2016, os projetos hidrelétricos enquadrados nas categorias de CGH (de zero a 5MW) passaram a ser liberados de requerer outorgas. Isso torna o processo autorizativo desses empreendimentos mais simplista e menos transparente, avaliam.

Os pesquisadores lembram que, muitas vezes, durante o processo de licenciamento das PCHs (usinas de 5 a 30MW) e CGHs, os projetos são avaliados individualmente. Com isso, os impactos cumulativos de um complexo de empreendimentos nos rios não são levados em conta. O que reivindicam é que se considere o contexto do local e o conjunto de projetos concebidos ou já implementados, para se ter uma avaliação conjuntural, do complexo hidrelétrico de modo inter-relacionado. E, aí sim, se comece a estudar o impacto ambiental nos termos deste conjunto de projetos e não de projetos isolados.

Indígenas Manoki em pesca tradicional por mascreação. Foto: Adriano Gambarini/OPAN.

Além dos efeitos sobre os ecossistemas aquáticos e terrestres, a presença desses empreendimentos ameaça os 25 projetos de assentamento e as 20 terras indígenas existentes na região, onde vivem os Apiaká, os Bakairi, os Enawene Nawe (Salumã), os Haliti (Paresi), os Kawaiwete (Kayabi), os Kajkwakratxi (Tapayuna), os Kawahiva, os Manoki (Irantxe), os Myky, os Munduruku, os Nambikwara e os Rikbaktsa, além de grupos isolados.

Situação geral dos empreendimentos no Juruena

Segundo o relatório técnico, subiu de 66 para 72 a quantidade de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) mapeadas em 2020 em comparação com 2019, e de 46 para 49 a de Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGHs), consideradas micro empreendimentos energéticos. O aumento representa um acréscimo de 9,09% de avanço do setor elétrico sobre esta região, responsável pela drenagem de cerca de 60% de toda água que flui no rio Tapajós. Ao todo foram identificados  146 empreendimentos hidrelétricos na bacia do Juruena, em Mato Grosso, sendo que 70% deles encontram-se em planejamento (103 projetos). Os que estão na etapa de construção são seis, o que equivale a 4,11%, e os em operação 37, ou 25,34% do total.

Cleiton Silvestrim, secretário-executivo da Rede Juruena Vivo, evidencia a importância do monitoramento para o acompanhamento de projetos hidrelétricos na bacia, além da necessária compreensão das informações pela população. “O monitoramento permite que a gente tenha acesso à informação de uma maneira mais clara e palatável. É uma ferramenta importante para nos apropriarmos de como são feitas essas pesquisas e entender como andam esses processos, que na maioria das vezes não são de conhecimento das bases e comunidades. E quando chega ao conhecimento, ele já está em fase avançada de licenciamento”.

Formada por diferentes agentes da sociedade civil interessados em alternativas para o desenvolvimento local, a Rede Juruena Vivo busca defender a integridade da bacia do rio Juruena e a participação popular nas decisões sobre o futuro da região. O grupo vem acompanhando o avanço de empreendimentos energéticos ainda na fase do planejamento, esperando que, assim, tenham mais tempo e condição de participar dos processos decisórios. Um dos projetos mais preocupantes em licenciamento no Juruena hoje é a UHE Castanheira, projetada para o rio Arinos e cujo empreendedor é a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Considerada prioridade pelo governo federal, recentemente, estudos ecológicos e antropológicos demonstraram, entre outros fatores, que este projeto poderá causar a extinção do bivalve tutãra e, com isso, afetar visceralmente a cultura do povo Rikbaktsa.   

Outra grande preocupação tem sido o avanço de projetos hidrelétricos altamente impactantes durante a pandemia, com implicações diretas ao direito à consulta e consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas. Este é o caso dos projetos da PCH Jesuíta, no rio Juruena, e da PCH Sacre 14, no rio Sacre, entre outros.

Rio dos Peixes (Guilherme Ruffing/OPAN).

Formada atualmente por 29 municípios, a bacia do Juruena está localizada no noroeste do estado de Mato Grosso. É composta por uma grande rede de rios que nascem no Chapadão dos Paresi e escoam suas águas límpidas por um percurso de mais de 19 milhões de hectares no sentido sul-norte até unirem-se com o rio Teles Pires e formarem o Tapajós. 

O mapeamento ainda destaca a falta de transparência dos órgãos responsáveis pela publicação de dados sobre os empreendimentos. É o que ocorreu no caso da PCH Ponte de Pedra, da CGH Santo Antônio II e da CGH Santo Antônio V. Embora haja informações sobre sua localização, os documentos  públicos disponíveis não permitem saber sobre as respectivas etapas.  O relatório recomenda que sejam aprimorados os sistemas públicos de busca por informações socioambientais no estado de Mato Grosso.

 

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