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Fepoimt recorre ao Ministério Público

Por: Lívia Alcântara/OPAN

A Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt) entrou com uma representação no Ministério Público Federal (MPF) que contesta uma das principais alterações efetuadas pela Medida Provisória n. 870, assinada pelo presidente Jair Bolsonaro, no primeiro dia do seu mandato.

A medida, que trata do funcionamento dos ministérios e dos órgãos básicos da Presidência, transfere a função de identificar, delimitar, demarcar e registrar as terras ocupadas tradicionalmente pelos povos indígenas da Funai para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

A alteração coloca em prática as promessas de Bolsonaro, realizadas durante a campanha eleitoral, entre as quais a de não demarcar “nem um centímetro a mais de terra indígena”. O ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento foi entregue nas mãos de Tereza Cristina (DEM-MS), conhecida por defender os interesses de fazendeiros e a flexibilização do uso dos agrotóxicos.

A Fepoimt, que representa 43 povos indígenas do estado de Mato Grosso, não é a única a se posicionar contra o desmonte da Funai. A medida provocou ações coordenadas do movimento indígena, que vem recorrendo com medidas cabíveis para contestar a alteração. Foi lançada também, pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a campanha “Sangue Indígena: nenhuma gota a mais”, com o objetivo de mobilizar a sociedade pelos direitos indígenas durante o #JaneiroVermelho.

Diretoria da Fepoimt. Foto: Luciano Umutina.

Conflito jurídico-administrativo

O documento, protocolado pela Fepoimt, alega que a reestruturação proposta pelo atual governo não possui lógica jurídico administrativa, o que é essencial na administração pública. A Constituição Federal, art. 231, estabelece que é poder e dever da União demarcar terras indígenas, sendo que esta função é regulamentada como responsabilidade do órgão indigenista oficial, a Funai. (decreto 1.775/1996 e Lei Federal n. 6.001/1973).

Para Eliane Bakairi, assessora da Fepoimt, a transferência da competência não era esperada, mas segue a linha de desmonte da Funai em andamento. “O que já vem acontecendo neste governo e em outros governos também é o sucateamento da Funai. Este foi o golpe final. A Funai já não cuida mais hoje da saúde, da educação. A única coisa que era específica dela, era a questão de demarcação, estudo e delimitação de terras. A gente acredita que os próximos passos podem ser a extinção da Funai”.

De todas as formas, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), promulgada como decreto pelo Brasil em 2004, estabelece a obrigatoriedade da consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas sobre medidas legislativas ou administrativas que possa afetar os povos indígenas.

Em outras palavras, a retirada da administração da demarcação de terras indígenas da Funai deveria, no mínimo, passar por uma consulta aos povos indígenas, como prevê o acordo internacional que tem força de lei.

Conflito de interesses: sociobiodiversidade x Menina Veneno

Os povos indígenas cumprem um papel essencial na conservação da sociobiodiversidade. Em Mato Grosso, as terras indígenas ocupam 16,57% do estado, onde vivem mais de 50 mil indígenas, segundo o último censo do IBGE, de 2010. São áreas de florestas e manutenção da flora e da fauna no estado.

O papel desempenhado na regulação do clima, por exemplo, é reconhecido internacionalmente nas Conferências do Clima, das quais os povos de Mato Grosso têm participado. Os indígenas têm nestes espaços o direito de fazer declarações aos chefes dos Estados, dado seu protagonismo no tema.

A ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina, que ficará à cargo da demarcação dos povos indígenas, está do lado oposto aos guardiões das florestas e das águas. Ela faz parte da bancada ruralista, um articulação de parlamentares da Câmara e do Senado ligados ao agronegócio.

Já em sua primeira entrevista como ministra, Tereza Cristina, conhecida como Menina Veneno, declarou que a alteração das regras para a ampliação do uso dos agrotóxicos no Brasil terá muito espaço em seu governo. Ela e a bancada ruralista, além da PL do Veneno, defendem a PL 3729/2004, que flexibiliza as normas para o licenciamento ambiental e beneficia empresários do meio rural.

“Há conflitos de interesses porque há conflitos agrários. A maioria das terras que ainda não estão delimitadas ou demarcadas têm conflitos com seus vizinhos, que são fazendeiros. E o Ministério da Agricultura representa os interesses destes fazendeiros”, explica Eliane Bakairi. A assessora da Fepoimt acredita que tempos duros virão: “agora é colocar o urucum e o genipapo e ir para a luta”.

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