Seminário em Lábrea
Povos indígenas e extrativistas do Médio Purus demandam por gestão compartilhada das áreas protegidas.
Povos indígenas e extrativistas do Médio Purus demandam por gestão compartilhada das áreas protegidas.
Por: Carla Ninos/OPAN
Lábrea (AM) – O Seminário “Gestão Territorial e Ambiental no sul do Amazonas – oportunidades e desafios”, realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) e Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus (Focimp), através do projeto Raízes do Purus com patrocínio da Petrobras, entre os dias 25 e 27 de agosto no prédio da prefeitura do município de Lábrea foi marcado pelo comprometimento com a proteção dos territórios e modos de vida de povos indígenas e comunidades extrativistas da região.
Entre os participantes, representantes de sete povos indígenas e três reservas extrativistas: Jamamadi (AM), Jarawara (AM), Paumari (AM), Apurinã (AM), Katukina (AM), Manoki (MT) e Xavante (MT); Resex Médio Purus (AM), Resex Ituxi (AM) e Resex Guariba-Roosevelt (MT). E, ainda, representantes de dez organizações da sociedade civil e órgãos governamentais como a Fundação Nacional do Índio (Funai), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), Ministério da Pesca e Aquicultura, Universidade Federal do Rio de Janeiro e Museu do Índio.
Desde o primeiro dia de seminário, o que norteou o debate sobre gestão territorial em Terras Indígenas (TIs) e em Unidades de Conservação (UCs) foi a importância de uma gestão compartilhada entre indígenas e extrativistas. A necessidade de se pensar em um mosaico de terras protegidas no Médio Purus foi apontada como tendência entre organizações parceiras desses povos e órgãos governamentais responsáveis por tais áreas.
“A proposta da construção de um mosaico de áreas protegidas na região é o que está dado. Neste seminário ficou muito evidente que a pressão em cima dessas áreas protegidas é grande, e também ficou claro o amadurecimento desses povos, tanto indígenas quanto tradicionais, ambos visando fortalecer as alianças em prol da proteção dos seus territórios”, analisou Gustavo Silveira, coordenador do Programa Amazonas da OPAN.
Para o indigenista da Funai, Marco Antônio Cordeiro, a luta pela proteção dos territórios está mais fortalecida, uma vez que se vê um grande número de organizações da sociedade civil engajadas em parceria com os povos indígenas e extrativistas. “Aqui no seminário a gente viu um alinhamento de todas as forças em favor da luta indígena, que busca a autonomia na gestão de seus territórios, e vimos que essa é a mesma demanda dos moradores das unidades de conservação”, comentou.
A representante do ICMBIO foi bastante questionada, principalmente por extrativistas e parceiros, que pedem mais diálogo por parte do órgão. Aline Martins, analista ambiental da Resex Médio Purus, assumiu o compromisso de “levar todas as demandas sobre a gestão da resex e sobre as discussões acerca da gestão compartilhada para a coordenação do ICMBIO para que juntos possamos minimizar os conflitos em prol de uma cogestão”.
Para Aclimar Duarte, presidente da Associação dos Moradores da Resex Ituxi, o seminário foi um espaço importante. “Nós pudemos conhecer um pouco do trabalho dos povos indígenas e das organizações parcerias desses povos. Nós queremos estabelecer parcerias com os indígenas, pois nós temos a mesma causa, somos vizinhos e temos que proteger nossos territórios”, afirmou o extrativista.
O seminário demonstrou a capacidade dos povos de resistir às adversidades. “Essa ideia de mosaico é interessante porque sabe-se dos conflitos existentes entre povos indígenas e extrativistas que estão no entorno de tudo isso. Então, se for implementado o mosaico, com certeza vai minimizar em grande parte os conflitos existentes pela questão do uso dos recursos pesqueiros e florestais”, afirmou Jeanne Gomes, engenheira de pesca do Ministério da Pesca e Aquicultura.
Troca de experiências
O seminário possibilitou a troca de experiências entre os povos do Amazonas e de Mato Grosso. As terras indígenas que encontram-se em áreas de transição entre os biomas Amazônia e Cerrado sofrem forte pressão do agronegócio e impactos de obras de infraestrutura (hidrelétricas, estradas etc.). As áreas protegidas do Amazonas também têm sofrido, cada vez com mais intensidade, com esse avanço da fronteira agropecuária, garimpo e com a extração ilegal de madeira. Reunir todas essas realidades foi um momento rico.
“Nós ficamos felizes em poder participar do seminário, em dividir nossas experiências na nossa terra, que, apesar de degradada, estamos lutando para plantar e nos sustentar. Foi interessante conhecer nossos parentes do Amazonas e um pouco da luta deles pela sustentabilidade e proteção de suas terras”, comentou o professor Cosme Rité Xavante, da TI Marãiwatsédé.
O cacique do povo Manoki, Manoel Kanunxi, ficou muito agradecido de poder conhecer os parentes do Amazonas e de “poder participar desse seminário que nos permitiu ver os desafios que os parentes enfrentam aqui. E nós gostaríamos de poder fazer uma troca de experiências com os parentes Katukina sobre o nosso trabalho com a apicultura”.
“Essa experiência é sempre positiva. Essa troca de realidades, desafios e oportunidades enriquece. Xavante e Manoki puderam observar as experiências dos povos da Amazônia. E o desafio é esse, pensar o território, a gestão, o manejo da biodiversidade, pensar em novas parcerias, em projetos que visem a sustentabilidade dos territórios”, analisou Artema Lima, coordenadora do Programa Mato Grosso da OPAN.
Lançamentos de planos de gestão
Ao final do seminário, foram realizados os lançamentos dos planos de gestão territorial dos povos Apurinã e Jamamadi. Para Zé Bajaga Apurinã, coordenador da Focimp, “o plano de gestão da Terra Indígena Caititu é muito importante para o povo Apurinã porque nos fez refletir de que maneira nós queremos gerir o nosso território. Agora nós estamos visando a implementação desse plano e vamos precisar do apoio dos parceiros”.
Os Jamamadi estavam extremamente felizes ao apresentar o plano de gestão. Para Magno Santos, indigenista da OPAN o povo Jamamadi começou a se empoderar do plano durante o processo de elaboração e muitos dos acordos estipulados já estão sendo cumpridos. “Agora, os Jamamadi estão com muita vontade de buscar a implementação, visando o apoio tanto dos parceiros quanto dos órgãos governamentais para ajudá-los no fortalecimento da gestão territorial”, comentou o indigenista.
O seminário encerrou de uma forma festiva por causa do lançamento dos planos de gestão e também com a demanda posta, tanto pelos povos indígenas e extrativistas quanto pelas organizações parceiras e órgãos governamentais, de se trabalhar visando a criação do mosaico de áreas protegidas no Médio Purus.
“Um seminário como esse, realizado aqui na prefeitura de Lábrea, no salão nobre, indica que essas populações deixaram de ser periféricas e ganham espaço para se tornarem proponentes de soluções para as suas sociedades e para os munícipes dessa região. Vemos aqui os povos com seus líderes, cada um apresentando seus êxitos e seus trabalhos, suas formas de defesas dos territórios e dizendo que estão mais felizes, o que é extremamente significativo”, avaliou Ivar Busatto, coordenador geral da OPAN.
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Carla Ninos – carla@amazonianativa.org.br
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