OPAN

A consolidação de um projeto

Povo Deni do rio Xeruã estabelece métodos de trabalho e elabora projeto visando incluir alimentos dos roçados na merenda escolar.

Povo Deni do rio Xeruã estabelece métodos de trabalho e elabora projeto visando incluir alimentos dos roçados na merenda escolar.

Por: Dafne Spolti/OPAN

Itamarati (AM) – Durante uma oficina de cinco dias com o indígena André Baniwa, muito reconhecido por sua experiência com organizações indígenas no Rio Negro, o povo Deni conseguiu diagnosticar e planejar melhorias na Associação do Povo Deni do Rio Xeruã (Aspodex). Esta ação foi apoiada pelo projeto “Arapaima: redes produtivas”, executado pela OPAN com recursos do Fundo Amazônia. Junto com lideranças e moradores de todas as aldeias, eles escreveram, ainda, o projeto “Mahaniru – agricultura tradicional Deni” para compra de alimentos de seu próprio roçado para as escolas Deni. E estão dispostos a provocar a prefeitura de Itamarati para publicar um edital o quanto antes.

André Baniwa. Foto: Renato Rodrigues Rocha/OPAN.

Para construir o projeto fizeram um mapa ecológico com os períodos do ano e que alimentos são produzidos, além das quantidades, por aldeia. A ideia é incluir produtos do roçado no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que paga R$ 0,60 de merenda (aluno/dia). O valor é mínimo, mas ajudaria os Deni a conseguir renda, até mesmo para contribuir financeiramente com sua associação, o que eles vêm buscando e pautando sempre.

Prudução do roçado por aldeia. Foto: Renato Rodrigues Rocha/OPAN.

A iniciativa do projeto mostra bem o momento em que os Deni estão atualmente. “Hoje começaram a entender os direitos e estão avançando”, disse Baniwa. Ele lembrou que há um tempo eles eram explorados para extração de seringa e não podiam fazer roça, como observou na atividade em que construíram toda a linha do tempo desde o período mais antigo em que não conheciam os “brancos”, passando pelo contato, o tempo dos patrões, o de luta, o de direitos e o tempo atual. “Amigos, hoje estamos vivendo porque plantamos muita banana, macaxeira, mandioca e batata. Por isso que para nossa assembleia cada aldeia traz comida e não falta nada”, disse Baba Hava Deni, cacique da aldeia Boiador, reforçando ainda o papel de sua organização.

Cartaz sobre roçado para elaboração de projeto. Foto: Renato Rodrigues Rocha/OPAN.

A partir da construção da linha do tempo na oficina, os Deni avaliaram também as dificuldades e os êxitos obtidos, as parcerias conquistadas e quais os assuntos merecem sua atenção. Definiram que precisam lutar por uma Coordenação Técnica Local da Fundação Nacional do Índio (CTL/Funai) em Itamarati, por melhorias na educação e na saúde, pela destinação correta para o lixo (principalmente das pilhas usadas em lanternas) – temas que já vem sendo encaminhados em suas assembleias. Para terem mais sucesso, construíram um calendário de reuniões bimestrais e o planejamento de todo o ano. “A realização de um primeiro planejamento operacional para a Aspodex foi fundamental, pois abriu possibilidades para que a associação contribua de forma mais concreta na superação das demandas apresentadas pelo povo”, destacou o indigenista da OPAN Renato Rodrigues Rocha.

O caminho dos projetos para as associações indígenas

Sistematização de informações. Foto: Renato Rodrigues Rocha/OPAN.

As oficinas revelaram, também, outras necessidades do povo Deni. Uma das maiores lacunas, como apontou André Baniwa, foi a dificuldade de escrita em língua portuguesa para a elaboração do projeto, o que ele acredita que pode ser superado por meio de um trabalho articulado com outras atividades, assim como pelo envolvimento das secretarias de educação. Essas questões são comuns a outros povos e se tratam de dilemas centrais quando o assunto é a proposição de projetos a financiadores.

“Uma das principais dificuldades é entender os meios que os financiadores usam, os formatos dos editais, a interpretação desses processos. São muito técnicos, muito burocráticos”, explicou a coordenadora financeira da OPAN, Rochele Fiorini. Ela destacou a dificuldade, muito comum, que os povos têm para a associação ficar em dia, por mais que grande parte já tenha registro como pessoa jurídica. “Têm clareza do que querem, das conquistas desejadas, mas falta tempo para ir ao cartório, ao banco etc”, disse a coordenadora, mostrando que essa obrigação compete com outros afazeres dos povos, como ir para à roça, ir pescar e caçar, por exemplo.

André Baniwa também observou a questão e mencionou a importância das parcerias com outras organizações até que o povo tenha totais condições de fazer as propostas por si só (atividade complicada também para não indígenas). Fiorini destaca que além desse acompanhamento, é importante que os financiadores desenvolvam modelos e formulários mais apropriados para as associações. “Cada um tem um modo de gerenciar, de viver”, afirma.

Apesar de ver as dificuldades de povos indígenas, a coordenadora entende que os financiadores também têm que prestar contas a seus doadores, o que deve ser feito com apresentação de indicadores de sucesso bastante técnicos. Para ela isso pode ser solucionado, porém, a partir de uma tradução das informações trazidas pelos indígenas na maneira de narração exigida pelos financiadores.

Contatos com a imprensa

Dafne Spolti

dafne@amazonianativa.org.br

(65) 3322-2980