Povo Rikbaktsa aposta no turismo como estratégia de gestão territorial
Diagnóstico participativo avalia potencial turístico das três terras indígenas
Cerca de 120 indígenas do povo Rikbaktsa participaram de uma programação para avaliar o potencial turístico de suas três terras indígenas (Erikpatsa, Japuíra e Escondido), localizadas no noroeste de Mato Grosso. Conduzida por Camila Barra, consultora para negócios comunitários e gestão territorial, a atividade contou com uma oficina sobre turismo de base comunitária, além do etnomapeamento de atrativos e do inventário de dinâmicas culturais. As atividades aconteceram durante o mês de outubro.
A estruturação do turismo de base comunitária está prevista no Plano de Gestão Territorial e Ambiental (PGTA) Rikbaktsa. Composto por pactuações e acordos internos, o PGTA é um documento elaborado pelo povo que pensa a gestão das terras indígenas em aspectos sociais e ambientais. É um instrumento de luta política e autonomia que reúne as principais diretrizes no que diz respeito à história, organização social e política, cultura, educação, saúde, geração de renda, vigilância, monitoramento e soberania alimentar.
“A gente saiu da tutela, montamos nossas associações, fizemos nosso PGTA e agora estamos estruturando o turismo, o que também vai ter seus obstáculos. Este passo vem a partir do nosso PGTA. Para o turismo nós temos que ter esse pensamento coletivo, do nosso povo, com todo mundo beneficiado por esse trabalho conjunto”, avalia Leonardo Rikbaktsa, cacique da aldeia Cerejeira (TI Japuíra) e vice-presidente da Tsirik, uma das associações do povo.
O turismo de base comunitária é estratégico para a implementação do PGTA Rikbaktsa. Trata-se de uma atividade capaz de trazer benefícios não só no campo socioeconômico, mas também cultural e territorial. “Além da geração de renda sustentável, pode ser uma atividade que os leve a atingir outros resultados, como a valorização da cultura, o fortalecimento da língua, a aproximação dos jovens e uma perspectiva de futuro por meio da ancestralidade. A gente avançou nessa conversa do turismo numa perspectiva de ferramenta de gestão territorial”, comenta Camila Barra.
“Foi muito importante tudo que ouvimos. Teve economia, cultura, os cuidados para receber o turista e como fortalecer a gente. Entendemos que tem turistas diferentes. E agora cabe à comunidade sentar e organizar como queremos, o nosso calendário, tudo. Precisamos saber como vamos planejar e organizar. Sentar e conversar com a comunidade”, reflete o professor Aristóteles Maniumytsa, da aldeia Primavera (TI Erikpatsa).
Também foi ressaltada a importância de adaptar essas ações ao calendário tradicional para que não tragam prejuízos socioambientais e culturais. As festas tradicionais, os rituais e os afazeres cotidianos não devem ser preteridos em favor do trabalho com o turismo. “Pensar como essa atividade poderia chegar sem impactar os modos de vida, sem impactar os calendários de atividades e o uso de recursos. Isso é chave”, complementa Camila.
O turismo de base comunitária tem como pressuposto básico garantir benefícios sociais e econômicos para a comunidade, portanto é importante que seja uma atividade agregadora e apropriada por todos, do contrário pode causar conflitos internos. “Nós queremos construir um bom projeto, fazer estudo e conquistar um turismo que cuide do nosso território. Vamos pedir apoio da nossa associação e cuidar para não ter divisão interna. Não queremos pensar apenas em dividir o dinheiro que vai chegar, temos que investir no que vai beneficiar toda a comunidade. Vamos pensar nisso daqui pra frente”, destaca Raimundo Iamonxi, professor da aldeia Babaçuzal e uma das lideranças da TI Escondido.
Uma vez que o turismo de base comunitária é uma atividade estratégica para o povo Rikbaktsa, é importante avaliar quais as modalidades (ecoturismo, etnoturismo, turismos de aventura, de pesca esportiva, cultural, arqueológico, gastronômico…) são mais viáveis de acordo com a realidade de cada terra indígena. É um momento importante para que a comunidade levante os diferentes potenciais e avalie a viabilidade de cada um.
“A formação foi importante para que todos pudessem compreender as diferenças entre o turismo convencional/empresarial do turismo de base comunitária. Principalmente sobre os processos de decisões, os custos envolvidos, a gestão do recurso e os cuidados com a comunidade. O diagnóstico também ajudou a refletir sobre quais experiências o turista poderia encontrar somente ali, como por exemplo o contato com a cultura Rikbaktsa”, avalia Luciana Rebellato, indigenista da Operação Amazônia Nativa (OPAN).
Próximas Capacitações
Com o diagnóstico participativo em mãos, o próximo passo é continuar o processo formativo para a implementação do turismo de base comunitária. Estão previstas capacitações para condução dos turistas durante as visitações e para formatação de roteiros de imersão cultural, além de uma formação específica sobre culinária e alimentação.
“Não é só pensar no cardápio para as atividades do turismo, mas como eles vão se organizar internamente para produzir esses alimentos. Quantidades, preços, como é que eles se preparam para poder oferecer essas refeições e terem um preço justo, com esse dinheiro ficando no território. Essa formação deve agregar muito e está focada na perspectiva da valorização da segurança alimentar, que também é objetivo do PGTA”, conclui Camila Barra.
A construção do diagnóstico participativo e as próximas etapas de capacitação estão no escopo do projeto Berço das Águas, realizado pela Operação Amazônia Nativa (OPAN) junto aos povos Rikbaktsa e Apiaká, com patrocínio do Programa Petrobras Socioambiental. Esta é a quarta edição do projeto, que tem apoiado, desde 2011, a gestão territorial de diferentes povos na bacia do rio Juruena. Os eixos norteadores dessa edição são a elaboração do PGTA na TI Apiaká do Pontal e a implementação do PGTA Rikbaktsa.